Faz mais de um ano que, numa entrevista do pâtissier alsaciano Pierre Hermé ao Le Figaro, vi-o elogiar o Bistro des Saveurs, restaurante de Thierry Schwartz em Obernai, cidadezinha a poucos minutos de Estrasburgo. Não imaginava que visitaria a Alsácia tão breve, mas registrei o nome. Tempos depois, ao programar a ida à região, saí em busca de informações sobre o lugar. Com uma estrela Michelin, o restaurante não é figurinha fácil em sites e blogs festejados e parece passar longe de rankings em evidência como o da revista Restaurant. O chef da casa, aparentemente, não pretende tornar-se celebridade. Minha intuição me dizia que havia coisa boa ali.
O ambiente me ganhou desde o primeiro momento. Lugar com jeito de casa, estrutura em madeira, assim como o mobiliário. A sala – volta e meia, invadida pelo perfume e o calor vindos da lenha queimando ao fundo – é simples e rústica, imensamente acolhedora. O gestual dos garçons e as mesas de apoio ao serviço deixavam claro tratar-se de um restaurante que preserva certos rituais de salão que foram solapados com o passar dos anos. E o melhor: consegue fazê-lo sem soar datado. Quando a comida começou a chegar, eu já tinha sido fisgada.
Gostosos bretzels chegaram acompanhados de um incrível presunto defumado de um produtor da região. Em seguida, delicadas tarteletes de abóbora e de nabo com azeitonas negras.
Não posso deixar de mencionar os soberbos pães que acompanharam o jantar. Me ajudaram a secar sucos e molhos que, eventualmente, restassem no prato, hábito que jamais abandono.
O menu de cinco passos teve início com um clássico da casa, a carotte fondante. Imagine a melhor cenoura que você ainda não comeu. Ela está à sua espera no Bistro des Saveurs. Não há truques ou jogos de ilusão. É cenoura mesmo. Cozida por algumas horas num bouillon de galinha, que é, depois, reduzido com suco de laranja. Chega ao prato coadjuvada por um creme de Munster com ervas.
O “ovo dentro do ovo” era um falso ravióli aberto, onde a “massa” não tem nada além de clara de ovo e o recheio, nada além de uma bela gema mole. Coroando o prato, lascas de trufas.
Na sequência, vieira e espinafre, em molho de açafrão. Simples e delicioso.
O cabrito, rosado e saboroso, tinha a companhia de alhos assados, purê de azeitonas e risoto de farro.
A sobremesa chegou sobre rodas. O carrinho de éclairs estacionou ao lado da mesa e as versões foram montadas na hora, com recheios e coberturas à nossa escolha.
A massa leve e fresquíssima aterrissou no meu prato em duas variações: cobertura de chocolate com recheio de baunilha e cobertura de amêndoas com recheio de caramelo e café. O sorvete de baunilha que as acompanhava era sublime.
Finalmente, perfeitas madeleines de chocolate encerraram uma noite memorável.
Saí dali feliz e segura de que aquela foi uma das melhores refeições que tive na França recentemente. Não apenas porque a comida estava impecável. Há certos códigos que fazem com que nos identifiquemos em maior ou menor medida com coisas, lugares, pessoas. Talvez isso explique o fato de o Bistro des Saveurs ter me ganhado de cara. Sou madeira, mais do que vidro ou aço. Gosto do que tem calor, mais do que do que é cool. Aprecio lugares que sabem preservar rituais sem parar no tempo, mas mantendo distância segura dos caprichos das temporadas. Em alguns aspectos, talvez eu seja mais antiga que moderna. Não sei se isso é bom ou mau. Só sei que assim é. E por ser assim, caí de amores pelo pequeno restaurante de Thierry Schwartz.
Le Bistro des Saveurs – 35 rue de Sélestat - Obernai