Já são três semanas de confinamento, saindo à rua cada vez menos. A cozinha é o lugar que mais tenho frequentado nesse momento. Por necessidade, mas também por escolha. É o útero da casa, como bem definia Rubem Alves, o lugar onde a vida cresce.
Meu fogão não tem sido palco para receitas ousadas e desafiadoras ou ingredientes impostores. Banana remete ao bolo da mãe. Cenoura, ao bolo de liquidificador que avó me ensinou ainda na pré-adolescência.
Quando o desamparo é muito, a gente busca esteio na zona de conforto. Como se, através das receitas de família e dos sabores da infância, pudéssemos manter uma normalidade fluindo, uma sensação de permanência e continuidade enquanto, lá fora, tudo é ruptura.
Portanto, não me venham com avocado. Numa hora dessas, abacate é abacate mesmo. E, ao menos aqui em casa, não vai ser desperdiçado na torrada de sourdough, coroado com flor de sal. Vai mergulhar no creme aveludado com que a mãe desde sempre adoça nossas vidas.