Paraíso Tropical: é tudo verdade

Abril 2009

Salvador. Talvez nenhuma cidade sintetize tão bem o balaio de misturas e contrastes que tanto marcam o Brasil. Na cidade onde o profano e o divino andam praticamente de mãos dadas, a gastronomia não foge à regra: aqui, a exuberância e a diversidade dos sabores podem ser encontradas tanto nos tabuleiros das baianas como num restaurante estrelado. Mas não foi nem em um, nem em outro que a encontrei ontem. Meu encontro marcado com o que pode haver de melhor na autêntica cozinha brasileira tinha endereço certo: bairro feio e fora de mão, sem atrativos, mas que passou a fazer parte do roteiro de todo aquele que chegue à capital baiana em busca de boa comida. Lugar obrigatório.

O restaurante Paraíso Tropical, de Beto Pimentel, no bairro do Cabula faz jus ao nome e à fama. Muito se diz da casa por aí: a melhor comida que se pode encontrar na Bahia. um dos berços de resgate do que há de verdadeiramente nosso. Hoje eu posso dizer: é tudo verdade. Uma refeição no Paraíso Tropical é daquelas pra não esquecer.

É bom estudar o caminho e ensiná-lo ao taxista. E mais: a conta de ida e volta, saindo do centro histórico ou do Rio Vermelho, não é das mais baratas. Mas todo esforço é recompensado na chegada. Ao vislumbrar o pomar e a horta de Beto e confirmar que é ali que ele abastece sua cozinha... Ao perceber a autenticidade de seu trabalho... Ao sentir o aroma do que é preparado naqueles fogões... A casa é simples, mas o que se faz ali é coisa rara. O uso de ingredientes brasileiros não é apenas mise-en-scène. É a opção de vida de um cozinheiro.

Começamos o almoço com os sucos sólidos das mais variadas frutas. Os de manga e mangaba estavam fantásticos.

Seguimos absolutamente inebriados. A saborosa tigelinha de polvo chegou acompanhada de uma delicada farofinha branca feita na manteiga e de um leve e delicioso molho de pimenta biquinho. A lingüiça de fumeiro vinha acompanhada de uma salada de vinagrete cuja vedete eram rodelinhas de biri-biri. Pois é, você nunca tinha comido  biri-biri? Eu também não...

Na sequência, uma inacreditável moqueca de polvo com camarão. Nela, o polvo e o camarão eram quase coadjuvantes de estrelas pouco prováveis como maturi – que é a castanha do caju ainda verde -, amora, pitanga, pimenta biquinho, flor de vinagreira e até o fruto do dendê. E novamente o biri-biri. Tudo isso acompanhado de arroz, farofa de dendê e aipim cozido com manteiga de garrafa. Sim, a felicidade pode se apresentar na forma de um prato.

Pra encerrar, finas fatias de abacaxi, maçã, jaca e banana grelhadas no mel.

Tudo isso com o privilégio da companhia de uma sabiá que, devidamente acomodada na mesa vizinha, como se cliente fosse, saboreava seus pedacinhos de mamão...

Mas privilégio mesmo é saber que muito do que passou por minha mesa é cultivado ali mesmo. É seguir o corredor que leva ao banheiro e deparar com um lindo cacaueiro. É ser apresentada ao pé de biri-biri pelo próprio Beto, em discurso apaixonado.

Saí de lá me perguntando como é possível sabermos, desde muito cedo, o que são mirabelles e fraises des bois e não termos idéia do que seja biri-biri ou maturi. Mas como é bom perceber que, apesar de, às vezes, parecermos ainda estranhos dentro de nosso próprio país, há pessoas que dedicam a vida a nos aproximar desse Brasil que desconhecemos.

 

Paraíso Tropical - Rua Edgard Loureiro 98-B
(segunda travessa à esquerda da rua Nossa Senhora do Resgate)
Cabula - Salvador

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